Como mãe do Vincent recordo a época em que o meu filho começou a pintar: a sua força de vontade, empenho e energia infinitas. O Vincent tão pequenino trabalhava durante horas seguidas. À semana, começava imediatamente após o regresso da escola e pintava até de madrugada. Aos fins de semana pintava à tarde e à noite. Ele teve de se esforçar para que eu compreendesse que o seu sonho era tornar-se em um pintor em tão tenra idade, pois eu não imaginava que ele desejasse levar a cabo um trabalho de tal envergadura tão cedo. Ficou-me na memória a imagem das suas mãos tão pequeninas a trabalhar incessantemente aplicando várias técnicas que ele próprio inventava e aperfeiçoava. Eu, maravilhada, observava o fenómeno e procurava compreender quais os materiais e utensílios que poderiam servir aos seus propósitos artísticos. Dada a quantidade e a diversidade dos trabalhos que ele ia realizando, a dada altura admiti que a sua pintura merecia ser compartilhada com o público e comecei a organizar exposições e a elaborar os catálogos. Nas inaugurações, o Vincent ficava muito feliz ao ver os seus quadros expostos e ao sentir que o seu trabalho era apreciado pelas pessoas que o felicitavam. A sua atitude motivou-me a prosseguir. Após as primeiras exposições, fui contactada pelo jornal Expresso e um artigo foi publicado, tendo o Vincent sido capa do caderno Vidas. Logo após, decorreram várias reportagens de televisão com equipas de filmagens em nossa casa. Os jornalistas desejavam ver para crer que o meu filho pintava de forma autónoma sem interferência de outra pessoa. Para responder às muitas perguntas que o público e jornalistas me colocavam elaborei uma conferência sobre o percurso artístico do Vincent que proferi em vários locais pela ocasião das inaugurações das exposições, e lancei o seu site internet. Logo surgiram mais artigos na imprensa e reportagens. As conferências deram origem ao primeiro livro sobre a pintura do Vincent, pois desejava que ficasse registado de forma rigorosa como é que um menino autista se transformou em um menino pintor. Foi uma época muito intensa para ambos, de muito trabalho da parte dele na realização das obras e da minha parte na divulgação da sua arte.
Ao longo destes anos, apesar das dificuldades de percurso, a pintura preencheu as nossas vidas com momentos de muita realização e alegria, ajudou-nos a retirar o foco das limitações e dificuldades do autismo e a pensar em algo mais belo. Atualmente, o processo artístico do Vincent continua e é com enorme satisfação que constato que o meu filho conseguiu transformar o seu sonho de criança em realidade, e que a sua pintura é apreciada e reconhecida ao seu justo valor. Pelo seu percurso desejo felicitá-lo.
Zélia Rocha
